domingo, 14 de setembro de 2008

O Espírito da Lei

Hans Kelsen conceituou a Constituição, através de uma pirâmide jurídica, como um conjunto dos princípios políticos e de direito que fundamentam a vida de uma nação. Ali estão alicerçados a forma de Estado e de governo e o estabelecimento da competência dos órgãos do poder público, da assecurabilidade dos direitos inalienáveis dos homens, da garantia da ordem, da igualdade e da liberdade, além da discriminação de penas aos infratores de seus termos. Ela se apresenta aparentemente de forma antagônica, por ocupar concomitantemente o topo e a base dessa pirâmide jurídica, tamanha a dimensão e poder que ocupa num espaço territorial. Ela nasce observando-se tanto o lado da realidade social, através dos fatos dentro do retrato espaço-tempo, como do mundo normativo que a rege dentro de todos seus fenômenos jurídicos adjacentes. Ela abarca não só os aspectos sociais, jurídicos e históricos como também filosóficos e religiosos. Fundem-se, desta forma, em uma só letra o Estado e legislação. Seu poder envolve os limites da cognição pois retrata em um só tempo e local o objetivismo e o subjetivismo, o macro e o micro, o universo e a célula das relações sociológicas. Ousa-se até, sob o ponto de vista humanístico, afirmar que a Constituição está de fato revestida sob o caráter da perfeição, pois na hipótese da falta de suas restrições, a humanidade estaria sujeita ao absolutismo de seus governantes sob a égide da suposta “onipotência, onisciência e onipresença” humanas, cuja história se nos apresenta repleta de exemplos. O caráter de suas cláusulas pétreas, imutáveis em relação aos direitos do homem, é a expressão de valores definitivos que se sucedem geração após geração inalteradamente. Acho que aí esteja o motivo do por quê da inexistência de grandes estadistas; exemplos de grandes administradores, de nomes que ficaram marcados na história. Talvez a resposta seja a não observância de regras constitucionais simples, como o estrito cumprimento do que reza o espírito da lei fartamente preconizado em todas as determinações da Magna Carta. E não as meras interpretações da autoridade pública de acordo com as suas conveniências. Tais condutas são inadmissíveis nos dias de hoje, pois não só maculam aquilo que há milênios veio se aperfeiçoando, como arruínam as legítimas pretensões dos que têm seus direitos violados. Nestes nossos dias há uma gigantesca gama de informações e de conhecimentos. Esses comportamentos equivocados nada mais produzem do que a proliferação de novos satíricos, causídicos da desgraça alheia e ostracismo e opróbrio de seus autores.

terça-feira, 2 de setembro de 2008

A Lei e a Escravidão

A questão da evolução do direito muitas vezes se confunde com a questão da evolução da sociedade e de seus paradigmas, como podemos ver quanto à personalidade.
Na história do direito verificamos que havia homens que não eram sujeitos de direito, tais como os escravos e os estrangeiros, aos quais eram negados os direitos dos seres humanos, sendo que, no caso dos primeiros, estes eram equiparados a “coisas” e os segundos não possuíam sob a vista do direito, personalidade.
Na Roma antiga, Espártaco comandou um levante de 70 mil escravos, cujo intento foi rechaçado pelo poderio romano com mais de 6 mil crucificações dos insurretos, cujos corpos ficaram expostos como advertência a novas tentativas de libertação. Por outro lado, porém, o espetáculo não provocou nenhum sentimento humano, pois nada havia a ser lamentado porque os escravos eram meras coisas, cujo destino e vontade pertenciam ao seu dono. Eram bens suscetíveis de venda e de compra por particulares e o fim da escravidão era inadmissível aos olhos do direito.
Com o desenvolvimento de pensamentos muito antigos, como o estoicismo da antiga Grécia e o cristianismo, a concepção de escravidão como regra passou a ser abandonada pela civilização contemporânea.
Hoje, a lei abomina totalmente a idéia de escravidão, porém isso somente aconteceu num passado recente, num interregno de 120 anos, sendo que ainda nesse meio tempo pudemos observar na história da humanidade ocorrências de milênios atrás.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Natureza do Direito Previdenciário

Há quinhentos anos a Europa expandia suas riquezas através da exploração dos recursos naturais do Novo Mundo com a abertura de novos mercados de consumo (comércio e indústria manufatureira). Na Inglaterra, o forte dessa expansão era a lã. As áreas de terra até então destinadas ao cultivo de subsistência do povo foram transformadas em pastagens. A grande massa populacional de camponeses não foi absorvida pela indústria, nem pela vida urbana e o resultado foram conseqüências funestas. A pobreza se instalou no país e por toda Europa ocidental. Uma legião de mendigos, vadios, ladrões e vândalos ali instalou-se, sendo então criados mecanismos para tentar reprimir e regular o fluxo dos desqualificados, tais como criação de leis para flagelamento dos vagabundos sadios, açoites, mutilações e enforcamentos. Na contra-mão, os resultados foram piores ainda, pois além de acumular os problemas, estes agravaram-se com a evolução do processo já desencadeado. Durante todo aquele século e também no seguinte foram criadas legislações a fim de frear o processo crônico e até então irreversível, as quais foram consolidadas e organizadas por dois relevantes decretos baixados pela Rainha Elizabeth I, sendo que o primeiro mantinha os castigos já estipulados e o segundo criava o "imposto dos pobres". As regiões administrativas então pré-delimitadas em suas determinadas regiões foram denominadas de "paróquias", onde eram pagos os tributos pelos habitantes ativos da área circunscricional. Desses impostos recolhidos, eram beneficiados principalmente os órfãos, os doentes e os velhos sem recursos que passaram a gozar dessa securidade social, mas o principal objetivo dessa regulamentação era o de reprimir e limitar a mendicância profissional. Isso gerou desvios dentro da instituição, tais como agenciamento e exploração de pedintes e de crianças. Esse era o aspecto desumano dessas "casas de caridade" passando-se então a limitar o ingresso de recém-chegados às tais paróquias, cujas restrições foram legalizadas a partir da "Lei do Domicílio" de 1672 que rejeitava aqueles que não eram regionalizados. Várias situações absurdas de desrespeito e indignidade para com o povo foram registradas, levando as autoridades a alterar e adaptar a legislação reiteradamente, até o advento do Ministério de Assistência ao Desemprego em 1934 que se estendeu praticamente para todo o planeta.

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Sempre é bom lembrarmos das raízes para reforçar a máxima: “quem somos, de onde viemos, para onde vamos”. Verificamos que os países que tanto sofreram no passado somente atingiram a prosperidade após declararem os direitos nas respectivas Cartas, que sobrepujassem a vontade de seus governantes. Como exemplos temos a Inglaterra, Estados Unidos e França.
Na Inglaterra, a garantia dos direitos individuais e dos usos e costumes do povo remontam ao ano 1215, quando a nobreza feudal as impôs, com o apoio dos súditos revoltados, ao Rei João Sem Terra, tendo-se em vista suas arbitrariedades e desmandos. Em 1689 foi promulgada a “Declaração de Direitos”, ou “Bill of Rights” por Guilherme III, que restringia a autoridade da realeza através de exigências do parlamento para corrigir, afirmar e conservar as leis.
Já, nos idos de 1776, na América, houve a “Declaração da Independência” que invocava a seguinte exposição de motivos: “Quando, no decorrer dos acontecimentos humanos, se torna imperioso que um povo rompa os laços políticos que o unem a outro, assumindo junto às potências do globo o lugar que lhe compete como nação independente ao lado de seus pares, e de acordo com as leis da natureza e as leis de Deus, impõe o devido respeito às opiniões da humanidade que esse povo declare os motivos que o levaram à separação...”
“Cremos que todos os homens foram criados iguais; que lhes conferiu o Criador certos direitos inalienáveis, entre os quais o de vida e de liberdade e o de procurarem a própria felicidade, que, para assegurar esses direitos, se constituíram entre os homens governos cujos justos poderes emanam do consentimento dos governados; que, sempre quando qualquer forma de governo tentar destruir esses fins, assistirá ao povo o direito de mudá-lo ou aboli-lo, instituindo um novo governo, cujos princípios básicos e organizações de poderes obedeçam às normas que lhe parecerem mais próprias a promover segurança e felicidade gerais.”
Em 1793 culminou na França, com a vitória da Revolução Francesa a “Declaração dos Direitos do Homem”, cuja introdução assim dizia: “O Povo Francês, convencido de que o esquecimento e o desprezo dos direitos naturais do Homem são as únicas causas da infelicidade do mundo, resolveu expor numa declaração solene esses direitos sagrados e inalienáveis a fim de que todos os cidadãos, podendo comparar sem cessar os atos do Governo com a finalidade de toda instituição social, não se deixem jamais oprimir a aviltar pela tirania; para que o Povo tenha sempre diante dos olhos as bases de sua liberdade e de sua felicidade, o Magistrado, a regra dos seus deveres, o Legislador, o objeto de sua missão.” E continua a Carta com mais 35 artigos, cujos primeiros são: “I – O fim da sociedade é a felicidade comum. O Governo é instituído para garantir ao homem o gozo desses direitos naturais e imprescritíveis. II – Esses direitos são a igualdade, a liberdade, a segurança e a propriedade. III – Todos os homens são iguais por natureza e diante da lei.”
Passados oito séculos, podemos observar que as atuais potências mundiais só conseguiram o topo da lista porque fizeram por merecer, ou seja, tendo em vista que a lei é o refinamento e a filtragem de todos os anseios humanos, pode-se ver expressamente em seus termos, quando firmes e concisos o retrato de uma verdadeira nação.